top of page
Foto do escritorLuzimar Soares

LGBTFOBIA, como lidar e proteger as pessoas?

Guarulhos, 15 de junho de 2022.

Luzimar Soares *.


Sempre que começo a pensar na escrita, faço um breve retorno sobre meus últimos dias, bem como tento compreender o espaço histórico onde estou nos dias atuais. Isso significa dizer que junho é o mês do orgulho LGBTI+, portanto, ainda que este não seja meu lugar de fala, peço licença à comunidade LGBTI+ para colocar minha observação acerca da violência que assola e ceifa a vida de pessoas que assumem suas identidades.


Crédito: Wix.


Nas relações da cotidianidade, como uma observadora incansável, ouço as colocações das pessoas e, muitas vezes, escuto frases que arrepiam a alma. São colocações capazes de percebermos o ódio latente, incrustrado e estrutural. As frases a seguir, certamente, já foram ouvidas por muitas pessoas: “até entendo que você seja gay, mas precisa ser afeminado?”; “por que a pessoa é trans?”; “não é normal essa coisa de gay?”; “homem e mulher, nasceram perfeitos para se encaixarem, então, essa coisa de gay, isso é anomalia”; etc. etc. e etc.


Sendo assim, me pergunto: qual a razão da vida do outro incomodar tanto? Qual o sentido de a sexualidade, o modo de viver suas relações, ou quaisquer outras características que não atinjam a sua vivência, provocar tanta raiva, indignação, e até ódio que mata? Por isso, resolvi buscar informações, e o que trago aqui são compreensões acerca de algumas estatísticas e artigos que li.


Bem, desde o ano de 2019, é crime tipificado na mesma lei do racismo, aliás, é decisão do judiciário, não do legislativo, o que significa dizer que não há uma lei própria, mas uma decisão judicial de colocar no mesmo entendimento os crimes e, por conseguinte, a aplicação das mesmas penalidades. Dessa maneira, lgbtfobia é crime, está previsto em lei, mas o que isso realmente mudou na prática.


Existem entidades da sociedade civil tais como: Acontece — Arte e Política LGBTI+, da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), que trabalham em prol de garantir os direitos dos LGBTI+, além de acompanharem os números da violência contra esse público. De acordo com os dados levantados, o ano de 2021 mostra um retorno ao crescimento de mortes de LGBTI+ que vinha em uma decrescente desde o pior ano que foi o de 2017. A seguir, um gráfico que monstra esses números:




Socialmente, nos relacionamos por afinidades, por afetividades, por identidades, por obrigatoriedade e afins, no entanto, se não entendermos que nosso espaço na vida no outro é limitado e que respeitar o que o outro é exige o mínimo que precisamos fazer, fica realmente muito delicado. A análise do gráfico acima nos mostra que a existência de uma lei não modifica, necessariamente, o comportamento social.


Vivemos, atualmente, uma crescente da evolução das intolerâncias em vários campos. A “moral e os bons costumes” são evocadas para justificar a intolerância com o outro. Usam-se as religiões para dizer que é “pecado”, com isso, justificam-se seus ataques, suas agressões, bem como a violência. No ano de 2017, 445 pessoas foram mortas, pelo fato de serem exatamente o que são, LGBTI+. A vida de um LGBTI+ deixa de ter valor quando os valores tradicionais são evocados.


A criação de uma lei não modifica o entendimento da população. Fomos e continuamos sendo educados sobre os valores familiares (somente da família nuclear, tradicional, ou seja, pai, mãe e filhos), esquecendo-se que as famílias, já há muito tempo, têm outras configurações. Além disso,


em 2013, uma resolução publicada pelo Conselho Nacional de Justiça garantiu o casamento homoafetivo no país, determinando que tabeliães e juízes são proibidos de se recusar a registrar o casamento civil e a conversão de união estável em civil entre homossexuais.


Já estamos em 2022, mesmo assim, muitos brasileiros continuam não “aceitando” o casamento homoafetivo. Aqui precisa-se considerar que o Código Civil brasileiro datado de 2002, instituído através da Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (completando este ano duas décadas), em seu artigo 1723, diz o seguinte: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.


Portanto, assim como a lgbtfobia, o reconhecimento das uniões homoafetivas foi conquistado através de muitas lutas da comunidade. Mesmo assim, a pessoas imbuídas de suas crenças, dogmas e valores recusam-se a compreenderem que não precisam aceitar, mas respeitar a individualidade. Muitos continuam a se escandalizar ao verem duas pessoas do mesmo sexo em momentos de troca de afetos. Tristemente, não param aí. As estatísticas mostram que a intolerância leva à morte das pessoas.


Aqui, gostaria de salientar que este é um tema que precisa passar pela educação, ou seja, precisamos educar para entender que espaços não dados não devem ser invadidos, o que significa dizer: as pessoas são donas de seus corpos e de suas vidas, têm total direito de viver suas relações livremente. Ao outro, cabe a obrigação de respeitar, de compreender a humanidade de cada ser humano.


Consequentemente, ao Estado cabe não apenas regular, mas educar, promover inclusão, instruir sobre a diversidade dos corpos, orientar através da educação a importância de todas as vidas. Além disso, cabe a nós, sociedade civil, entender e buscar formas mais inclusivas, bem como saber que na comunidade LGBTI+ também existe diferença de quem é mais morto. De acordo com o relatório divulgado pelo site do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTI+, é violência de gênero. Os dados a seguir mostram,


A violência materializada contra os corpos de LGBTI+ é, em grande medida, uma violência de gênero, visto que as mortes de travestis, mulheres transexuais e mulheres cisgêneras totalizaram 153 casos, representando 48,42%. Desse total, é evidente que as primeiras foram as mais atingidas, com 141 mortes (44,62%), enquanto o número de mulheres cis mortas foi de 12 (3,80%). Os homens cis foram, em números absolutos, os mais vitimados pela violência, com um total de 150 pessoas (47,47%). Já os homens trans somaram um total de 8 pessoas mortas (2,53%).


Sendo assim, quero encerrar pedindo para que quem ler este material, respeite, ame, eduque, caminhe de mãos dadas e ajude as redes de proteção para que parem de nos matar. Não importa se você é hetero, homo, lésbica, bi, trans, queer, inter ou assexuada, seja humano e entenda que o outro é exatamente isso, humano.


Referências:



Mortes e violências contra LGBTI+ no Brasil: Dossiê 2021 / Acontece Arte e Política LGBTI+; ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais); ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos). – Florianópolis, SC: Acontece, ANTRA, ABGLT, 2022. Disponível em: https://observatoriomorteseviolenciaslgbtibrasil.org/wp-content/uploads/2022/05/Dossie-de-Mortes-e-Violencias-Contra-LGBTI-no-Brasil-2021-ACONTECE-ANTRA-ABGLT-1.pdf. Acesso em 09 de jun. 2022.


Presidência da República. LEI N o 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 09 de jun. 2022.



RIBEIRO, Felipe. Entenda a criminalização da LGBTfobia. Disponível em: https://faribeiro.jusbrasil.com.br/artigos/868811422/entenda-a-criminalizacao-da-lgbtfobia. Acesso em: 09 de jun. 2022.


Supremo Tribunal Federal. STF enquadra homofobia e transfobia como crimes de racismo ao reconhecer omissão legislativa. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=414010. Acesso em: 09 de jun. 2022.


*Luzimar Soares é historiadora (PUC-SP/USP).

55 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comentarios


bottom of page