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A História, as Fake News e, seus intercruzamentos

Luzimar Soares*

Guarulhos, 15 de março de 2022.


A sociedade humana vive uma onda de mentiras que não é exatamente nova, pois é sabido que conchavos e mentiras sempre fizeram parte da vida pública e privada. No entanto, desde 2016, as Fake News (alavancadas nos EUA) têm alimentado a desinformação, especialmente na política. As eleições de 2016 nos EUA escancararam para o mundo a utilização dessa ferramenta, por meio das redes sociais e, por esta razão, conseguindo maior velocidade na disseminação, resultando na vitória de Donald Trump.



Crédito: wix.


Também na França, as eleições de 2017 foram marcadas por intenso uso das Fake News. Essa utilização foi tão grande que levou o parlamento a votar uma lei contra esse uso de estratégia, bem como punir redes sociais com o banimento de contas. Obviamente, esse uso de inverdades não é exclusivo desses dois países, no entanto, tal como nos EUA, também na França as eleições (tanto as 2016 quanto as de 2020 nos EUA, bem como as de 2017 na França) escancararam a não preocupação em serem descobertos, haja vista a pós-verdade ter se tornado um elemento em que não há necessidade de provar se um fato é verdadeiro ou não; porque aquilo que é dito ou encaminhado por alguém com credibilidade, ou que comunga dos mesmos pensamentos, não é questionado.


Nos estudos sobre a política brasileira, invariavelmente, encontram-se inúmeras construções falsas, e algumas demoram bastante tempo até que sejam efetivamente desmascaradas, como é o caso do Plano Cohen. Este documento, criado pelo próprio governo, deu legitimidade para a continuidade de uma soberania, ou seja, a de Getúlio Vargas e seus aliados, utilizando de uma criação própria, denunciando a existência de um plano comunista que degradaria a sociedade e colocaria em risco a família e as pessoas de bem. Existem versões diferentes sobre quem foi o criador de tal Plano, todavia, o resultado da utilização de uma mentira trouxe como consequências: fechamento do Congresso, banimento de partido, além da utilização da máquina governamental (como o Departamento de Imprensa e Propaganda, bem como do Ministério da Educação) para sustentar um regime ditatorial.


O medo do comunismo por grande parte da sociedade brasileira tem sido utilizado há muito tempo e, no período varguista, teve o nome de Plano Cohen. No entanto, não foi a única vez que a ameaça comunista assolou o país em forma de mentiras. Foi utilizada, também, em 1964 para justificar mais um golpe, e voltou com força total nas eleições de 2018. As referências ao “perigo vermelho”, ao “kit gay”, entre outros, estão em muitas das propagandas políticas encaminhadas pelas mídias sociais.


Uma das principais características das redes sociais é a velocidade com que tudo se espalha, seja para o bem ou para o mal. Sendo assim, a utilização de mentiras para deturpar uma situação alcança uma enormidade de pessoas em questão de segundos. Mas, não é só isso. A utilização dos boots, os robôs da internet, para impulsionar o espalhamento das Fake News, transforma o cyberbullying (quando se trata de uma pessoa em particular em algo) em algo altamente volátil, levando, inclusive, ao assassinato e ̸ ou suicídio da pessoa que está sendo exposta. Existe um ditado popular muito utilizado por anos: “quem conta um conto, aumenta um ponto”. Na era digital, esse ditado passa para as telas dos computadores e telefones, viajam na velocidade das fibras óticas e corroboram as crenças das pessoas que já buscavam um alicerce onde ancorar suas crendices.


Cada dia mais fica difícil de separar o que é verdade do que é mentira, as construções de Fake News estão mais elaboradas e muitas se ancoram em notícias verdadeiras, distorcendo parte, colando pedaços de outras informações, ou, ainda, editando vídeos de maneira que as falam sejam transformadas naquilo que se quer “vender”. As mídias sociais se tornaram uma ferramenta muito importante de comunicação, de resgate de amizades, de pessoas que não se viam há anos conseguirem se reencontrar, no entanto, as mídias sociais, em alguns grupos, têm a característica de meio de comunicação informacional, ou seja, muitas pessoas preferem as informações advindas dessas fontes.

Uma comunicação feita por três estudiosos da USP em 2020, Sheila Freitas Gomes, Juliana Coelho Braga de Oliveira Penna e Agnaldo Arroio, aponta que, na atualidade, muitos preferem buscar suas informações, bem como compartilhá-las por meio das mídias sociais por diversas razões, e uma delas é a velocidade de repassar essas notícias. De acordo com eles:


A velocidade está sendo a grande 'carta na manga' das notícias falsas, as quais se disseminam por meio de diversas mídias sociais como WhatsApp, Facebook, Twitter, entre outras de grande aderência. A notícia ganha impulso, propaga-se como um verdadeiro incêndio virtual e, dessa forma, consolida opiniões e supostos conhecimentos sobre os mais variados temas. Por exemplo, na área da saúde: preocupado com a repercussão das notícias fictícias, o Ministério da Saúde, no ano de 2018, criou um canal chamado "saúde sem fake news", no qual é disponibilizado um número de telefone para que as pessoas, antes de compartilhar, possam enviar as supostas notícias verdadeiras e verificá-las.

Fake News vence eleição, desestabiliza economias, assassina e leva ao suicídio. É preciso uma legislação para punir quem divulga, mas, além disso, é preciso que haja uma forma inteligente de bloquear essas informações. A pós- verdade serve para corroborar um pensamento pré-existente, além de não se comprometer em pesquisar ou questionar o que está sendo dito. Elika Takimoto, em seu livro Como dialogar com um negacionista, afirma que:


A emergência da pós-verdade não está conectada ao fato de discutirmos se a verdade existe ou não. [...]Não lhes interessa discutir qual é a verdade ou o que, de fato, aconteceu. Não se trata de comparar narrativas, porque um discurso verdadeiro não é condição suficiente para alterar o compromisso afetivo.

Ao fim e ao cabo, se não aprendermos a questionar, a nos posicionar, a buscar as fontes, e, especialmente, a nos educarmos para investigar o que está sendo propagado, corremos o risco cada vez maior de sermos manipulados em todos os sentidos e de acreditarmos no que está posto, deixando que nossas vidas sejam guiadas e mantidas pelos donos do poder.


*Luzimar Soares é historiada (PUC-SP).

Contato: luzimarsb@hotmail.com

Intagram: luzimarsb


Referências:


ARROIO, Agnaldo; GOMES, Sheila Freitas; PENNA, Juliana Coelho Braga de Oliveira. “Fake News Científicas: Percepção, Persuasão e Letramento”. In: Ciência & Educação, Bauru, v. 26, e20018, 2020, pp. 1-13.

TAKIMOTO, Elika. Como dialogar com um negacionista. São Paulo: Livraria da Física, 2021.


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